Programação Senciente

Um estudo em Inteligência Artificial

 III - Bases Filosóficas e Psicológicas - Parte 1

"O que é real? Como você define o real ? Se real é o que você cheira ou ouve ou vê ou toca, então, real é, simplesmente, sinais elétricos processados pelo seu cérebro" (Morpheus)

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Baseamos muitas de nossas conclusões e atos em definições imprecisas e conceitos vagos. Aprendemos, ao longo da vida, alguns métodos para distinguir bom de ruim, certo de errado, causa de coincidência, verdades de mentiras, conhecimento de crença, para citar apenas alguns. Cada um, desenvolvendo suas próprias formas de identificação, atribuições qualitativas e conjuntos de respostas apropriadas. Pessoas envolvem-se em argumentações a respeito das suas diferentes visões de um mesmo conceito ou evento. Isso torna nossa plasticidade mental e conseqüente capacidade de adaptação a grande responsável por nossa funcionalidade.

Uma entidade artificial, como um programa senciente, não dispõe deste recurso e, por conseqüência, necessita que as definições que utilizamos de forma imprecisa ou até contraditória em nosso dia-a-dia, sejam especificadas com clareza, de forma a permitir sua utilização, na forma de algoritmos ou parâmetros. Mesmo que "algoritmos de imprecisão" ou lógica difusa sejam utilizados, os mesmos continuam sendo algoritmos, especificados e repetidos da mesma forma, e necessitando igualmente de definições (o quanto posso ser impreciso em relação a algo, por exemplo).

Qual seqüência de testes deve ser efetuada, e contra quais informações, para se concluir que um determinado evento é a causa de outro, e não uma simples coincidência ? Quais passos devo tomar para saber se estou sendo bom ou mal ? Como estar certo de que estou certo ? Qual algoritmo pode ser utilizado como base segura para avaliar sentimentos a se desenvolver (e conseqüentemente, ações a tomar), em relação a outra entidade identificada  (um "não-eu" ou circunstância ambiental). Como defino o que é importante ?

Todos nós sabemos tudo isso. Cada um a seu modo.

Estruturações filosóficas ou psicológicas são as expressões funcionais do processo evolutivo do sistema nervoso. Primeiro, detectamos dor e reagimos a ela. Depois, aprendemos a detectar um conjunto de situações que levam a ela. Conceituamos e contextualizamos estes conjuntos sensoriais, atribuímos valores e credibilidade a eles e, para tanto, desenvolvemos conceitos ou processos que nos permitam distinguir uma informação válida (útil, que evita a dor), de uma invalida (uma inverdade). Com a evolução, criamos conceitos como "importância" ou "causa", e todo um corpo teórico que os relacione. Nosso conhecimento é o resultado deste processo.

Os mesmos mecanismos que inicialmente se desenvolveram para "compreender" a dor e mantê-la à distância, quando aplicados a obtenção de informações diferentes, criam corpos de conhecimento diferentes. Aprendemos a aprender graças aos mecanismos da dor. Agora usamos o aprendizado para outras finalidades.

Um primeiro grupo de conceitos, idéias e processos, os quais aplicam-se somente a entidade em si (Funcionalidade Individual), é abordado nesta parte. Um segundo grupo, relativo a seu relacionamento com outras entidades (Funcionalidade Relacional), compõe a segunda parte.

 

Propósito

Diferentemente de um fato pré-existente, que foi conceituado por nossas formas de pensar ("planetas" e "cavalos" já existiam fisicamente, antes de criarmos as palavras que hoje utilizamos para nos referirmos à eles), um propósito é uma construção mental que atribui uma finalidade instrumental à uma entidade. O reconhecimento de relacionamentos causais entre eventos à nossa volta nos permitiu a percepção de adequabilidade de certas entidades à criação de certos efeitos. Posteriormente, evoluímos para a construção de entidades (ferramentas), ainda mais adequadas à causar os eventos desejados. Uma pedra, inicialmente, pode ter sido suficientemente adequada como ferramenta para quebrar coisas, mas os martelos e marretas, criados posteriormente, e já com o "propósito" de servirem à este fim, são mais eficientes.

Tomando-se por base o exemplo acima (o martelo), podemos concluir seu propósito a partir de suas características. Uma alavanca que aumente o momento de uma peça metálica pesada deve servir ao propósito de desferir golpes localizados.

Talvez nesse ponto resida a maior das diferenças entre entidades sencientes naturais e as artificialmente criadas. Analisando-se (de forma semelhante ao martelo), o aparato das naturais, conclui-se que o propósito das formas de vida é viver. Manter-se vivo, alimentar-se, evitar os perigos à sua forma de vida, reproduzir-se e assim manter a vida como a conhece. Simplesmente, viver.

Entendo ser razoável admitir que à uma entidade artificial se deva impor uma finalidade adicional ou até em substituição a esta, e cuja satisfação seja também associada a mesma importância da sobrevivência para uma criatura natural.

O desenvolvimento de uma entidade artificial, que valha-se dos mesmos mecanismos sencientes das naturais para avaliar o ambiente, depende da adequabilidade da finalidade desejada da mesma a estes. Um exemplo seria a tentativa de implementação de tais estruturas para interagir com ambientes completamente caóticos ou totalmente estagnados (mudanças permanentes, sem repetições em ciclos ou padrões detectáveis, ou nenhuma mudança). Mesmo um ser humano deixaria de ser funcional face a tais ambientes, podendo-se, portanto, esperar o mesmo de uma entidade que replique seus processos, mesmo que parcialmente.

Sendo o primeiro passo na criação da entidade desejada, a definição de seu propósito de vida serve como linha-guia para todas as definições posteriores, começando com seu sistema sensorial e os processos utilizados para manusear suas informações e concluir a partir delas.

 

Sensores, Grupos Sensores, Sentidos e Sistema Sensorial

Uma das poucas alusões físicas neste capitulo, o sistema sensorial também deve ser claramente definido, uma vez que é a base de todo o restante do modelo.

Um sensor é uma fonte única de um tipo específico de informação, e inclui os recursos necessários à tradução desta informação em um formato utilizável pelo sistema.

Portanto, cada sensor:

bulletdeve ser identificado de forma exclusiva no sistema ao qual pertence (confundir uma queimadura no pé com uma no braço não causará uma reação apropriada).
bulletfornece um único tipo de informação, como, por exemplo, temperatura (uma escala graduada), presença ou ausência de algo (uma chave binária), etc
bulletdeve ser qualificado como causador de dor ou não, e ter seus limites definidos (temperaturas acima de certos valores são qualificáveis como dolorosas, e exigem uma reação diferente das medianas)
bulletpertence a um único grupo sensorial

Um grupo sensor é um conjunto de sensores de um mesmo tipo, passível de um critério adicional de agrupamento (grupo sensor de temperatura do braço esquerdo, por exemplo), caso este no qual se define uma hierarquia no agrupamento sensorial.

Um sentido é uma modalidade sensorial definida pelo união de um ou mais grupos sensores (os grupos sensores de temperatura, pressão e contato formam o sentido do tato, por exemplo).

Um sistema sensorial é o conjunto dos sentidos.

O ponto mais importante em relação ao sistema sensorial é que o mesmo só é funcional dentro das condições ambientais para as quais evoluiu. O sistema visual humano, nosso sentido de maior importância atualmente, serviria para quase nada num ambiente com algumas vezes os níveis de luminância normais, ou na completa escuridão das cavernas. Nossos ouvidos, parte do sistema auditivo, cuja forma nos permite definir a direção da qual um som se origina, perde esta funcionalidade num meio com diferente condutividade sonora, como a água, por exemplo. Os sistemas sensoriais, individualmente ou em conjunto, só operam devido à sua adequação ao meio ambiente no qual a entidade evoluiu.

 

Realidade

Realidade é o conjunto dos valores detectáveis pelo sistema sensorial.

Somos restritos aos nossos sentidos (naturais ou estendidos por ferramentas). Definidos e limitados por eles. À realidade pertencem somente as dimensões para as quais dispõe-se de recursos sensores. Se não dispomos de ouvidos (ou ferramentas que detectem sons, e os traduzam para uma modalidade sensorial que possuímos), os mesmos (para nós), não existem.

No caso de ferramental tecnológico, seja uma mera lupa ou um radio-telescópio, os mesmos só fazem parte de nossa realidade (e conseqüentemente, as informações que nos trazem), por serem detectáveis à nós. Seus princípios de funcionamento foram derivados de informações que já existiam em nossa realidade.

Um ponto importante aqui é que sob essa definição, a realidade não é o que existe, mas como interpretamos o que conseguimos captar. Para entidades sencientes, é completamente indiferente se suas informações sensoriais são provenientes do que entendemos como sendo suas origens, ou meras ilusões geradas artificialmente.

Um segundo ponto importante é sobre a adequação do sistema sensorial à realidade circundante. O nosso evoluiu ao longo de bilhões de anos, desde nosso ancestral mais remoto agitando-se nos oceanos cambrianos, até se tornar o que é hoje. Suficientemente apropriado pela adaptação ao ambiente no qual existe, nos fornece dados adequados ao nosso nível de funcionamento. O desenho de uma nova entidade senciente encontra na definição de seu sistema sensorial seu primeiro e um dos maiores desafios. Quais sensores, quantos, de que tipo, com quais valores de operação serão necessários à sua sobrevivência no ambiente proposto ?

Mudanças no sistema sensorial, seja para uma nova entidade em desenvolvimento, ou para nós mesmos, equivale a mudar a estrutura do próprio Universo que nos cerca.

 

Atributos, Entidades e Ações

Sensores podem detectar grandes quantidades de informações ao longo do tempo, as quais devem ser organizadas em unidades reconhecíveis, de forma a serem posteriormente trabalhadas por outros níveis mentais. A base para uma tal organização é um corpo de regras que permita a diferenciação das mesmas.

Atributos são informações obtidas diretamente dos sensores. Cores, temperaturas e formas, por exemplo, são atribuições detectáveis e, quando submetidas às regras de agrupamento, definem elementos componentes os quais, novamente sob a definição de regras, constituem as entidades. Portanto, atributos (ou adjetivos) são criados anteriormente às entidades (ou substantivos).

Já as ações de que cada entidade é capaz (verbos), são também detectáveis, como variações nos atributos das entidades, percebidas ao longo do tempo, como quando o atributo "altura" de uma entidade diminui, e dizemos que a entidade "encolhe", ou que é capaz da ação de encolher. Num universo sensorial estático, seria impossível a criação de verbos. Nada faz nada.

Uma grande distinção que vale notar aqui é entre ações próprias e de outros. Mudanças detectadas na realidade de forma independente de qualquer acionamento próprio (sistema eferente), são classificáveis como de outro. Para as ações próprias, sempre haverá uma correspondência com um comando iniciado pela própria entidade.

Um ponto importante a se notar aqui é que a linguagem básica de uma entidade artificial é dependente (como todo o resto), de seu universo sensorial. Caso muito distinto do humano, esquemas de tradução serão necessários até para se obter informações compreensíveis da mesma.

 

Tempo, Ciclos e Momentos

O tempo é a percepção da presença do fluxo de informações sensoriais.

Caso houvesse um "relógio-mestre" controlando esse fluxo para o ambiente conforme é percebido, uma pausa do mesmo seria completamente indetectável. Mesmo a existência de instrumentos em nossa realidade seria afetada por uma tal parada. Seu avanço seria suspenso e, portanto, deixariam de registrar o acontecimento.

Novamente, como no caso da realidade, o tempo não é a dimensão ordenada e crescente, subjacente à eventualidade por si, mas a sensação de continuidade imposta pelo fluxo de informações de nosso sistema sensorial.

Os ciclos são repetições de padrões sensoriais dentro de períodos de tempo observáveis, e são vitais à nossa estruturação mental. Deixamos de funcionar em um ambiente completamente caótico (sem padrões reconhecíveis), assim como num que seja completamente estável (sem mudanças reconhecíveis). Sistemas sencientes baseiam-se na interpretação de padrões distinguíveis na realidade observada. Operamos apenas nas faixas que intermedeiam o caos e a estagnação.

Já os momentos são períodos de observação, aqui entendida como um processo de aquisição sensorial. Alguns eventos ocorrem mais lenta ou rapidamente que outros. Algumas ações são mais longas que outras. Portanto, ao invés de se dividir em unidades cronométricas fixas (como períodos), a extensão de um momento varia em função do que se observa.

 

Fatos

Um fato é uma combinação de valores sensoriais.

Quer sejam as detecções de luz e sombra identificadas posteriormente como a presença de alguém, ou as modulações sonoras que reconhecemos como a voz desta pessoa, o fato desta presença é o reconhecimento de uma combinação sensorial.

Passíveis das mais diversas classificações, podemos dividir inicialmente os fatos entre (1) entidades, (2) acontecimentos, (3) ações e (4) estados, divisão esta que pode ser tomada por base para as definições da estruturação sensorial. Divisões diferentes exigirão definições sensoriais diferentes, capazes de perceber os aspectos desejados.

A capacidade de individualizar combinações sensoriais em fatos distintos é bastante primitiva, parte das faculdades interpretativas de cada modalidade. No caso de uma entidade artificial, as definições qualitativas, quantitativas e topológicas de suas modalidades deverão incluir os recursos à esta distinção.

 

Eventos

Um evento é a detecção de um fato ou a percepção de um cenário por uma ou mais unidades consecutivas de tempo de amostragem.

Conforme mencionado acima, o fluxo sensorial muda ao longo do tempo, sendo praticamente inútil em sua forma direta. A transformação destes dados brutos em informações úteis inicia-se com o reconhecimento e agrupamento em padrões, como os fatos e cenários, e a associação a estes de atributos, como nos conceitos e contextos.

Uma outra forma de reconhecimento necessário é a da ocorrência de eventos. Uma vez que, por definição, um evento esta diretamente relacionado a um determinado fato ou cenário, este critério fornece visões diferentes de um período de amostragem, dependendo do foco utilizado.

De forma similar à conceituação factual e contextualizações, os eventos também devem ser conceitualizados, recebendo atributos que permitam seu manuseio posterior de forma apropriada. Entretanto, a contextualização de um evento gera uma visão distinta das contextualizações individuais por cenário, uma vez que leva em conta os diferentes cenários percebidos ao longo de sua duração.

Uma vez que um argumento de verificação pode durar mais que um único ciclo de percepção, fazendo com que a duração dos eventos seja relativa ao argumento em si, ao invés de um tempo pré-determinado. Em termos práticos, segue as definições utilizadas para MOMENTOS, conforme exposta acima.

 

 

Conceitos, Símbolos ou Signos

Um conceito é um conjunto de atributos associados a um fato.

Não utilizamos os fatos diretamente. Uma dada combinação sensorial, indicativa da presença de um fato, é utilizada como uma palavra-chave numa busca, varrendo nosso índice de conceitos, símbolos ou signos, usados aqui intercambiavelmente.

Arquétipos fornecem significações a fatos cuja importância é comum à sobrevivência da espécie. O que dói, do que ter medo, fatos reconhecidos instantânea e comumente como bons. Alguns animais operam a maior parte de suas vidas sobre essas informações. Outros (como nós, por exemplo), desenvolveram a habilidade de expandir tais conceituações, assim como criar novas. Um cão não nasce sabendo reconhecer a face do dono, distinguindo-a de um estranho. Essa significação ocorreu depois, resultado de um processo individual em decorrência de sua historia. O mesmo pode-se dizer do cavalo que aprende seu caminho de volta para casa. Já o conhecimento das rotas migratórias das aves e peixes é arquetípico, compartilhado por todos os membros da espécie.

Estudado pela Semiótica de Peirce (Charles Sanders Peirce, filósofo, cientista e matemático que por volta de 1880 publicou textos sobre o que ele chamava de "a teoria geral dos signos", e que veio posteriormente a ser chamada de "semiótica"), o processo de atribuição de significados a fatos é o que viabiliza nossa capacidade de aprender e responder melhor à mudanças no ambiente observado. Animais que conceitualizam apresentam maiores chances de sobrevivência num mundo com taxas maiores (ou maior velocidade), de mudanças. 

Como parte da herança genética, cada espécie capaz de significação recebe um "modelo" (no sentido do inglês template), a ser preenchido inicialmente, quando do encontro com um fato novo. As informações mais básicas devem ser preenchidas imediatamente (me machuca? me mata? serve para comer?, etc). Formas de vida mais avançadas vêem todo fato novo como uma possível ameaça, e por uma boa razão: até que se adquira alguma informação sobre ele, o mesmo PODE ser uma ameaça à existência da entidade, e este é um risco grande demais para se correr. Provavelmente, as formas de vida menos cuidadosas em seus primeiros encontros se extinguiram mais depressa que as mais cautelosas, garantindo assim seu legado paranóico.

Uma vez completadas as linhas-em-branco iniciais, a quantidade de informações adicionais adquiridas e atribuídas ao fato depende da sofisticação da entidade considerada, e de seu interesse no mesmo. Dai para frente, o conceito é utilizado no lugar do fato, sofrendo modificações à medida que mais informações são obtidas, ou reavaliadas de forma distinta da original.

Uma nova entidade artificial não herdará modelos de significação, validados por anos de evolução. Os mesmos deverão ser criados e testados até que proporcionem a funcionalidade desejada.

 

Cenários e Contextos

Um cenário é uma simultaneidade de conceitos. Um contexto é uma conceitualização de um cenário.

A cada momento registramos a presença de conjuntos de conceitos, conforme detectados por nossas modalidades sensoriais, individualizados em fatos relacionados a seus atributos. Como numa fotografia, registramos o cenário à nossa volta. O conjunto detectado é utilizado novamente como palavra-chave de pesquisa, buscando uma lista de atributos para o mesmo, exatamente como na conceitualização. 

Continuidade natural do processo de significação, a capacidade de manter atributos de cenários contribui positivamente para a auto-preservação, permitindo formas de avaliação mais complexas (os conceitos presentes, individualmente, não representam perigo, mas seu conjunto sim).

Uma contextualização pode abranger informações mais abrangentes que as da conceitualização, como o período do ano em que acontece, ou quais os contextos precedentes e sucessórios a ela, apenas para citar alguns.

Dadas as suas similaridades, valem aqui as observações feitas sob o item anterior.

 

Verdade

Um organismo senciente, seja natural ou artificialmente criado, deriva sua denominação da habilidade de sentir ou interiorizar informações sobre o ambiente à sua volta. Estas informações devem ser conceituadas e contextualizadas, e posteriormente classificadas, antes de se tornarem úteis às estruturas mentais posteriores. Dentre todas as classificações necessárias, entendo que a mais básica seja a que identifica verdades.

Uma das definições atribuídas a palavra "verdade", pelo Dicionário da Língua Portuguesa, é a de ser "uma representação fiel da realidade". Sob este aspecto, a capacidade de identificar verdades torna-se importante no âmbito individual por expressar a precisão de nosso mapeamento do mundo externo e, conseqüentemente, a adequação de nossas reações a ele. Já no relacional, tal habilidade nos permite agregar conhecimentos válidos aos nossos, sem que os recursos necessários à sua comprovação estejam disponíveis (credibilidade).

O Positivismo Lógico ou Empirismo de Ayer (Sir Alfred Jules Ayer - filósofo britânico - 1910 - 1989), define que "uma expressão pode ser classificada como verdadeira ou falsa se (e somente se), (a) for verificável empiricamente ou (b) for verdadeira ou falsa por definição". Um exemplo simples de (a) seria "ao anoitecer, a quantidade de luz natural diminui", e de (b) seria "todos os homens chamados João chamam-se João". No caso, ambas verdadeiras. Qualquer outra forma de expressão passa a ser classificada como um "julgamento pessoal", e torna-se, por definição, inverificável.

Esta conceituação torna verdadeira toda e qualquer detecção sensorial (fato), o que apresenta a desvantagem de não considerar possíveis distorções ou ilusões intencionais.

Teorias modernas de construção de sistemas utilizam a percepção trina como suficiente para a validação de uma informação (uma mesma informação detectada igualmente por 3 entidades distintas torna-se válida). No caso de duas percepções iguais e uma diferente, indica-se uma possível falha ou vence a maioria. No caso de uma única entidade, pode-se valer de um critério de repetição, no qual uma mesma combinação de informações sensoriais (fato), torna-se VERDADEIRO quando de sua terceira repetição (ou um outro número que se mostre adequado ao Universo desejado). Uma vez validado o fato (descrição fiel da realidade), o mesmo pode ser utilizado como verdade na elaboração de conceitos, cenários e contextos, os quais também devem passar por validações.

Portanto, verdade é uma detecção tripla (ou um outro número apropriado), de uma dada ocorrência (fato, conceito, cenário, contexto, evento, etc). Uma outra forma de afirmação da mesma seria a detecção simultânea de um fato por 3 sistemas sensoriais distintos.

 

Raciocínio

Raciocínio é definido pela Wikipédia (http://pt.wikipedia.org/wiki/Raciocínio), como "...uma operação lógica, discursiva e mental. Neste, o intelecto humano utiliza uma ou mais proposições, para concluir através de mecanismos de comparações e abstrações, quais são os dados que levam às respostas verdadeiras, falsas ou prováveis. De premissas chegamos a conclusões."

Em sua obra Organum, datada de 342 a.C., Aristóteles definiu o raciocínio lógico como a validação ou invalidação de um argumento, o que é composto por uma série de proposições (declarações/afirmações), onde uma delas é a conclusão e as outras são premissas. Uma proposição é uma sentença que pode ser verdadeira ou falsa, e a conclusão a suposta conseqüência lógica de tais declarações. Tal conseqüência é uma inferência (do latim inferre, conduzir à). As duas modalidades principais desta forma de encadeamento, conforme definidas em sua obra, são o raciocínio lógico dedutivo e o indutivo. Na argumentação dedutiva pretende-se que suas premissas forneçam uma prova conclusiva da veracidade da conclusão ("Todos os homens são mortais;Sócrates é um homem;Sócrates é mortal"). Já na argumentação indutiva, busca-se na argumentação a sugestão de uma probabilidade que suporte a conclusão ("Joga-se uma pedra na água, ela afunda;joga-se a segunda pedra na água, ela afunda;a terceira pedra jogada na água afundará").

Dessa forma, pretende-se que a Lógica seja, ainda segundo a definição de Aristóteles, o meio que possibilite, a partir de conhecimentos tidos como verdadeiros, a formulação de leis gerais de encadeamentos de conceitos e juízos que levariam à descoberta de novas verdades. Entretanto, uma tal formulação repousa na premissa de que todos os aspectos de um dado agrupamento sejam conhecidos, o que é impossível, tanto por não se poder saber TUDO a respeito de algo, como pelo fato das verdades serem, por si, informações meramente relativas. Na dedução constata-se a adequação do objeto da conclusão às características de conjunto das premissas (para saber que Sócrates é mortal tenho de avaliá-lo como pertencente ao conjunto "todos os homens", os quais, até onde sei, são mortais, pelo simples fato de nunca ter encontrado um que não o seja). Dessa forma, baseia-se no empirismo (todos os homens que vi até hoje são mortais), sendo limitado por minhas experiências (ou conhecimentos), sobre esse conjunto. Sua utilidade fundamental resulta de sua capacidade inerente de avaliar nossas percepções a respeito de seus objetos de raciocínio e dos conjuntos aos quais está relacionada.

Já na indução surge um ferramental adicional, pois possibilita a criação de possibilidades a partir de um conjunto reconhecidamente incompleto de informações, o que não se obteria diretamente a partir do empirismo ("coisas parecidas, mas não iguais, aos membros de um dado conjunto, PODEM vir a se comportar de forma semelhante à eles").

O caráter relativo das verdades e conhecimentos aos quais está-se sujeito, parece dar razão ao filósofo indiano Acharya Nāgārjuna (150-250 d.C.), criador de uma linha de pensamento que ficou conhecida como "O Caminho do Meio", ou Madhyamaka, no qual aceita-se uma existência formal, que é dependente, que é emergente e que é compreendida em termos de sua interação e inter-relacionamento.

Verdades absolutas não são reconhecíveis nem pelos sentidos, nem pelo raciocínio.

 

Importância ou Relevância

Relevância é a qualidade de relevante, que apresenta relevo. Algo que se destaca na paisagem, segundo um critério (uma montanha se destaca pela altura, uma cratera pelo oposto). Usadas de forma sinonímica, ambas indicam a presença de uma ou mais características em algo (um fato, um evento, um cenário, etc). Um conhecimento importante para quem deseje pescar é o de como aproximar-se da água.

Importância ou Relevância são conceitos relativos à um critério escolhido em função de um desejo (necessidades também servem à definição dos mesmos critérios, mas sendo basicamente uma forma imposta de desejo, a mesma definição se mantém válida).

Sendo uma das definições mais básicas no manuseio das informações sensoriais, as atribuições de importância mais comuns cabem àquelas que indicam riscos à existência da entidade. Informações de dor ou risco de dor ou dano, para citar algumas, figuram entre as mais importantes de que dispomos.

 

Causa, conseqüência e coincidência

O entendimento de relações causais entre os elementos presentes na realidade encontra-se na base da formação do conhecimento. Entretanto, como as únicas informações das quais dispomos são as sensoriais, as relações causais também estão sujeitas às mesmas limitações do restante das estruturas mentais que construímos com elas. Interpretamos como causas os elementos que seguem padrões de ocorrência (observação sensorial), de forma coerente à regras pré-estabelecidas.

De uma forma geral, podemos dizer que um elemento pode ser considerado a causa de um determinado elemento-efeito se:

bulletfor anterior ou contemporâneo a ele (uma causa nunca é posterior a seu efeito, de acordo com nosso sistema sensorial)
bulletestiver presente quando da detecção do elemento-efeito, num número satisfatório de vezes (tende a 100%)
bulletestiver ausente quando da não-detecção do elemento-efeito, num número satisfatório de vezes (tende a 100%)

Tais percepções podem atribuir a duas entidades uma relação causal primária ou imediata, primeiro passo na construção de uma cadeia causal. Relações semelhantes entre a causa imediata e outros elementos expandem a cadeia em arranjos de maior complexidade, os quais incluem:

bulletRelações causais múltiplas (um elemento-efeito somente ocorre quando da presença de mais de um elemento-causa)
bulletRelações causais dependentes (um elemento-efeito somente ocorre quando da presença de TODOS os elementos-causa)
bulletRelações efeituais múltiplas (um elemento-causa provoca mais de um efeito)

A definição de uma cadeia causal completa deve perseguir os relacionamentos entre os elementos, formando arranjos como os acima citados, até que todos os ramos terminem numa ação, acontecimento ou estado. Cada vínculo deve ser observado e validado contra um número satisfatório de ocorrências, de forma a receber a atribuição de verdade (fato científico), ou crença pessoal.

Também parte importante da definição de uma tal cadeia é o estabelecimento de regras ou leis. Se eu fizer (ou se acontecer) "x" com um elemento A, acontece B. Entretanto, mesmo na presença do elemento A, se eu não fizer "x", B não acontece. E B também acontece caso "x" seja feito com um elemento C. Isto exige a distinção entre os tipos de elementos com os quais se cria a cadeia, como a utilizada na definição de fatos ((1) entidades, (2) acontecimentos, (3) ações e (4) estados), tratando cada relação (ou pesquisando as cadeias de eventos), de forma apropriada.

 

Conhecimento

"Gnose é o substantivo do verbo gignósko, que significa conhecer. Gnose é conhecimento superior, interno, espiritual, iniciático. No grego clássico e no grego popular, koiné, seu significado é semelhante ao da palavra epistéme. Em filosofia, epistéme significa "conhecimento científico" em oposição a "opinião", enquanto gnôsis significa conhecimento em oposição a "ignorância", chamada de ágnoia."

(Texto extraído do site GNOSISONLINE - "Conceito de Gnose" - http://www.gnosisonline.org/Teologia_Gnostica/index.php)

Um das definições mais conhecidas dadas à conhecimento é atribuída à Platão, e diz que "Conhecimento é uma crença verdadeira e justificada". Sob esta ótica, pode-se dizer que conhecimento é uma crença com justificativas suficientes para torná-la digna de credito e ser considerada verdadeira, sendo a justificativa um critério de verificação  aceito como válido.

Tendo ainda em vista a definição de REALIDADE, toda e qualquer forma de conhecimento é empírico ou arquetípico. Ou nascemos sabendo ou sentimos a informação, mesmo que tal experiência resuma-se a sentar em uma sala de aula e ouvir e ler (sensoriais), informações fornecidas por alguém.

Uma vez assimilada, a experiência sensorial torná-se disponível em nossa memória para posterior análises e conclusões. Portanto, um passo anterior à formação da crença é a observação. Ao tentar entender algo, a entidade deve revisitar sua memória, desta vez buscando elementos que sejam relevantes à compreensão desejada.

            

O critério de validação tanto pode ser uma afirmação quando a negação da afirmação (aquilo me morde é um conhecimento, assim como aquilo NÃO me morde também é, apesar de distinto do primeiro). A não confirmação pelo critério de validação significa que a crença não pode ser verificada por ele e é, portanto, uma opinião pessoal (baseada em observação e crença, porem não demonstrável aos outros).

Portanto, o processo cognitivo deve ser capaz de efetuar as diversas atividades relacionadas à aquisição de conhecimento, a saber:

1) Observar  2) Criar um sistema de crenças  3) Dispor de critérios de validação e aplicá-los  4) Criar um corpo de conhecimentos, distinto de opiniões

Este processo é repetido sobre cada elemento da cadeia causal sob análise, até que a mesma esteja completa ou encerrada precocemente (com ramos terminando sem ser em ações, acontecimentos ou estados).

 

Observação

"- Por favor, que caminho devo tomar para sair daqui?" pergunta Alice ao Gato Sorridente, na obra de Lewis Carrol

"- Ah, isso depende muito do lugar para onde você quer ir" responde-lhe o gato

Observar é definido pelo dicionário da língua portuguesa como sendo um verbo transitivo, vindo do latim observare, e recebe designações como "olhar ou examinar com atenção e minúcia; espreitar; espiar; atentar e reparar". Fundamental ao conceito de formação de conhecimento, a observação dá início ao processo de exame dos dados obtidos e significados inicialmente por processos de semiótica. Entretanto, somente revisitar as memórias seria de pouca valia, a menos que se esteja de posse de um critério que nos permita distinguir entre os "importantes" e os "não-importantes". Precisa-se definir o que se esta buscando. Um processo de observação com um critério de busca pode ser definido como uma pesquisa.

Um primeiro critério de busca, e o mais natural, é o efetuado por situações dolorosas ou ameaçadoras. As definições do sistema sensorial já provêem as ferramentas para o reconhecimento de tais situações. Basta extraí-las da memória, na forma de EVENTOS que se adequados ao mesmo.

 

Crença

Uma vez de posse das memórias sobre eventos que apresentem o critério desejado (nesse primeiro caso, situações dolorosas ou ameaçadoras), o próximo passo é definir as crenças em relação a tais momentos. Para tanto, olha-se os outros elementos presentes em tais situações. Quais outras entidades estavam presentes? Quais ações foram tomadas? Qual o estado em que se encontrava? Dentre todas estas, quais foram anteriores ao critério sendo compreendido? O exemplo abaixo (sob VALIDAÇÃO), mostra inferências criadas a partir de regras contendo SEMPRE e NUNCA, as quais podem se mostrar excessivamente rígidas para lidar com o mundo real, fazendo com que ajustes de tolerância sejam necessários antes da criação do sistema de crenças.

 

Validação

As crenças baseiam-se na observação pontual de um evento, e a aplicação de regras simples, como presença e precedência. Uma vez criado um grupo de crenças, precisa-se em seguida validá-las através da observação de outros eventos com o mesmo critério de escolha. A forma mais simples de validação é a repetição da mesma combinação (ver nota sobre níveis de tolerância, acima).

Este processo deve ser repetido até que se obtenha uma arvore causal que termine numa ação, estado ou acontecimento, de forma a permitir a definição de uma regra. Caso contrário, o entendimento ficará incompleto (sei que é assim, mas não sei por que).

 

Bom e Mau

Bom é causar o bem, assim como Mau é causar o mal. O bem contribui para o atingimento de uma finalidade. O mal é o oposto do bem (que prejudica seu atingimento). Ser Bom é praticar o bem. Ser Mau é praticar o mal. Sob esta ótica, Bom e Mau são relativos à uma finalidade desejada. Somente por compartilharmos um objetivo comum (manter a vida), é que dispomos de pré-definições comuns para tais conceitos. Abraham Maslow sugere que as pessoas já nasçam com um senso inato de valores positivos ou negativos (arquetípico), sendo os positivos atraentes, e os negativos, repulsivos. Entre os positivos destaca justiça, honestidade, verdade, beleza, humor, vigor, poder (mas não poder abusivo), ordem (mas não preciosismo), inteligência (mas não convencimento). Entre os negativos, injustiça, morbidez, feiúra, fraqueza, falsidade, engano, caos etc (ver http://pt.wikipedia.org/wiki/Sentimento). O vínculo entre valores que contribuem com a manutenção da vida (atrativos), os que a prejudicam (repulsivos), e o objetivo comum (a manutenção da vida), é evidente mesmo a primeira vista.

Bom e Mau são atributos, julgamentos pessoais impostos ao entendimento de uma percepção. Dessa forma, além de sua relatividade ao objetivo desejado, também são relativos à compreensão de quem procede a atribuição. A medida em que cresce a sofisticação do entendimento sobre o processo avaliado, maiores são as chances de mudanças entre as duas atribuições. Entretanto, conforme também notado por Maslow, qualquer associação com valores negativos implica em avaliações repulsivas. Tirar uma vida é mau; tirar uma vida para que várias outras possam continuar pode apresentar resultados positivos (principalmente para os sobreviventes), mas devido a associação com valores negativos, o agente se torna repulsivo, o causador de tal ato seria banido, e a vitima transformada em mártir.

Vista desta forma, a luta entre Bem e Mal, conforme identificada pela contraposição entre os sete pecados capitais às sete virtudes cardinais, apresenta-se como uma oposição entre a racionalidade, única faculdade capaz de distinguir o que é realmente necessário ou importante, à nossa tendência natural de obter vantagens de sobrevivência, e desfrutar de suas aquisições.

 

Humores, Sentimentos e Emoções

Humor é a auto-avaliação de um organismo sobre sua aderência à comportamentos benéficos à sua sobrevivência, feita em termos de médias de DOR e PRAZER.

Conforme notado por Bozarth (Michael A. Bozarth - Departamento de Psicologia - Universidade Estadual de Nova York - Buffalo), em seu estudo de 1994 intitulado Sistemas de Prazer do Cérebro (http://www.addictionscience.net/ASNreport01.htm - em inglês), a evolução criou mecanismos dispostos em áreas específicas do cérebro, voltados à gratificação de modelos comportamentais que resultem positivamente à sobrevivência da entidade. Da mesma forma, comportamentos que resultem negativamente são punidos com sensações gerais negativas. Spencer(1880) sugeriu que duas forças fundamentais governam a motivação: PRAZER e DOR. De forma parecida, Trolan(1928), sugere que as sensações prazerosas são associadas à comportamentos que beneficiam a sobrevivência, assim como as sensações desagradáveis são associadas à comportamentos negativos à mesma. Dessa forma, comportamentos positivos são reforçados através do prazer (sensações agradáveis), e os negativos são desencorajados através das sensações ruins.

As atividades de entidades biológicas implicam em transmissões nervosas. Seja no reconhecimento da saciedade pelo alimento ingerido, ou na percepção de uma ameaça física. Em suas terminações ou pontos de contato (sinapses), os sinais elétricos são transformados em uma descarga química de substancias conhecidas como neurotransmissores. A detecção de uma ameaça causa uma descarga de epinefrina e norepinefrina, que sobrecarregam o corpo com mensagens de tensão (e subseqüente stress, se mantida por períodos longos). A presença da norepinefrina inibe a conversão da serotonina em melanina, principal hormônio liberado pelo organismo durante o sono, que indica que tudo esta bem e o corpo pode começar a se recuperar (não descanse até que as coisas estejam bem). A serotonina também regula os hormônios de stress, e sua presença é responsável pelos estados de relaxamento e bem estar, associados aos mecanismos de recompensa do cérebro. Drogas como a cocaína e a nicotina disparam a liberação de dopamina diretamente de uma área central no cérebro chamada de núcleo accumbens, estrutura chave nas respostas à gratificações, motivações e vícios.

Resultado final das combinações de neurotransmissores e outros hormônios no organismo, o humor ou mais precisamente, o estado de humor de uma entidade é uma indicação de como aquele organismo está percebendo seu próprio estado, em relação às suas necessidades de sobrevivência. Traduzido em termos de DOR e PRAZER, sumariza, de momento em momento, sua própria auto-avaliação.

Cada estado distinto de humor influencia a forma como novas informações são percebidas e as reações à elas. Um desenho apropriado de avaliação de resultados, acumulo dos mesmos em humores e seus efeitos sobre as avaliações e conseqüentes reações de uma entidade senciente artificial também deve ser considerado quando de sua elaboração.

Reconhecendo na versão epicurista do hedonismo um modelo suficientemente funcional para a modelagem artificial do sistema de humores e suas influencias sobre motivações e comportamentos, sua utilização recai ainda sobre a dependência da sofisticação desejada na implementação. Modelos artificiais mais simples podem dispensar estas características.

Sentimento(s) também é uma interpretação qualitativa efetuada sobre um coletivo de informações sensoriais, momentâneas ou evocadas da memória, mas que diferentemente dos humores (físicos), é feita com base em associações, sejam arquetípicas, históricas (vivenciadas), ou aprendidas de outra forma. A interpretação é qualitativa por atribuir tonalidades de bom ou mau ao conjunto, porém por se basear em associações prévias, opera mais como uma lembrança do que como um processo cognitivo. Um exemplo simples seria associar a visão de um cão ao seu animal de estimação da infância (=bom), e sentir-se bem à sua vista, ou ao que o atacou e feriu quando pequeno (=mau), e sentir-se mal, sob efeito do mesmo padrão visual.

Emoção é definida, etimologicamente, como proveniente do latim emotionem, derivado tardio de uma forma composta de duas palavras latinas, ex "fora, para fora", e motio "movimento, ação, comoção, gesto". Portanto, uma emoção é, por definição, a preparação para uma resposta externa, dada em função de um sentimento, ou a combinação de sentimento e humor (avaliação de ambiente e estado no momento). A intensidade desta combinação define a intensidade da preparação e, conseqüentemente, a da ação dai proveniente, que vão de alterações metabólicas menores, que influenciam outros julgamentos, até a execução de modelos comportamentais pré-armazenados para a mesma, efetivamente agindo no mundo externo.

Creio que a maior dificuldade no entendimento do conjunto destes processos reside no fato dos mesmos interagirem e interdependerem  de forma sistêmica. Se cultivo boas emoções, desenvolvo uma quantidade maior de neuro-receptores capazes de receber informações químicas positivas, portanto crio associações deste tipo em maior quantidade, o que me leva a ações condizentes com este estado. O mesmo vale para seu oposto. Discernir com precisão o em quanto ou qual aspecto forneceu uma determinada resposta é difícil, mesmo sob condições controladas.

Como no exemplo acima, ao ver um cão ao qual atribuo a qualidade de MAU (sentimento), utilizo caminhos neurais que liberam a norepinefrina (adrenalina!), causadora de reações físicas em meu organismo (humor), que me preparam para "lutar ou fugir" (reação emocional). Uma vez que o cérebro reage de forma bastante semelhante tanto à memória quanto à visualização em si, posso me sentir de forma parecida (e, portanto, evocar uma cadeia quase equivalente de respostas), somente por me lembrar do animal.

Um outro ponto de dificuldade é a atribuição de irracionalidade ao conjunto destes mecanismos. Apesar de datarem de uma fase evolucionária pré-linguística, e, portanto, apresentarem uma maior dificuldade na sua vocalização e articulação lógica, o sistema emocional utiliza os mesmos mecanismos de observação e associação de atribuições que, quando expandido, resulta nos processos de formação cognitiva que usamos conscientemente. É uma forma de inteligência ou racionalidade primitiva, a única da qual muitas das entidades biológicas do planeta dispõe ainda hoje, para avaliar uma situação e responder apropriadamente. Assim como os mecanismos ainda mais antigos e instintivos, também continua presente e fortemente atuante em cada um de nós.

 

Motivação

Motivação é o conjunto de mecanismos que mantém a mente em funcionamento, buscando conhecimentos novos que possam ser úteis à criação de estratégias, as quais compõe os modelos comportamentais utilizados pela entidade.

Frederick Herzberg (http://pt.wikipedia.org/wiki/Frederick_Herzberg), foi o autor da Teoria dos Dois Fatores, que divide a MOTIVAÇÃO (motivo de ação), como se originando em 2 fatores distintos. Ao primeiro ele chamou de "higiênicos", e ao segundo, "motivacionais". Basicamente, fatores higiênicos compõe o ambiente. Segurança, alimentação, temperatura, etc. Sua falta nos causa problemas, portanto agimos para evitá-la. No segundo grupo (motivacional), estão incluídos elementos que buscamos. Agimos para obtê-los. O resultado da obtenção dos elementos buscados é a SATISFAÇÃO.

É fácil se compreender o "motivo" que causa ações de busca de satisfação dos fatores higiênicos de Herzberg. Seguem a mesma linha de evitar a dor, conforme descrita até agora.

Já o que nos MOTIVA a BUSCAR uma satisfação não-higiênica é a percepção de valor estratégico atribuído à ela (caráter pessoal). Esse nível de abstração coincide com a capacidade mental necessária ao uso de ferramentas. São, portanto, exclusivos de humanos e primatas superiores. Os objetivos dessa busca não são as "coisas-em-si", mas a situação vantajosa que se atribui à sua obtenção. Dinheiro, por si só, na forma de papeis impressos, representam muito pouco, mas as vantagens estratégicas relacionadas à sua posse são motivos suficientes para que me ponha em ação. O mesmo vale para vencer desafios, obter novos cargos, expandir as fronteiras, etc, etc.

Entretanto, apesar da distinção feita por Herzberg, vale notar que há uma ligação entre os dois âmbitos motivacionais, exatamente na forma do posicionamento ou vantagem estratégica mencionado acima. Uma posição "vantajosa" é aquela que me proporciona melhores condições de manter satisfeitas as necessidades higiênicas. Quanto mais famoso for, quanto mais dinheiro tiver, quanto mais isso ou melhor aquilo, ENTENDO (percepção pessoal), que fico mais distante da falta das primeiras (ninguém se motiva a obter algo que PERCEBA como uma desvantagem, sendo essa definida por critérios completamente pessoais).

Dessa forma, podemos dizer que tanto Frederick Herzberg quanto Abraham Maslow concordam em termos de mecânica do processo. A única diferença é que os dois fatores do primeiro seriam representados pela hierarquia do segundo, dividida pelo estágio mental do uso de ferramentas.

Novamente temos aqui uma conseqüência da evolução dos processos mentais. A partir do momento em que me torno inteligente o bastante para avaliar vantagens estratégicas (uso de ferramentas, modos de se obter algo), passo a buscar o que percebo, com o mesmo ímpeto utilizado antes para evitar as dores e auto-aniquilação, com a vantagem de me perceber como "SENDO MAIS" ou "TENDO MAIS" algo que os outros, que por si só já é prazeroso (ver item acima).

Uma vez que SEMPRE vamos desejar o valor estratégico percebido (uma vez que a mecânica é a mesma das satisfações básicas), o que determina o POTENCIAL ou INTENSIDADE do desejo é a percepção da possibilidade de sua realização. Algo percebido como impossível não nos motiva. Quanto mais próximos, quanto mais possíveis, segundo nossas inferências, maior a motivação por obtê-lo. Essa possibilidade é avaliada tanto na forma de viabilidade de obtenção, quanto dos custos advindos da mesma (represálias ou castigos, por exemplo). Uma penalidade muito alta por algo pode ser tão "desmotivante" quanto a impossibilidade física. Essa, ao menos, é a idéia na qual a maioria dos nossos sistemas de direito se baseiam. Não se precisa criar leis para proibir algo que ninguém queira !

A Teoria X de Douglas McGregor postula que uma pessoa, deixada por conta própria, não fará nada. O que a movimenta são as constantes necessidades que devem ser satisfeitas. Os níveis de energia de um organismo determinam sua viabilidade. Por isso, faz sentido que o mesmo mantenha-se direcionado à ações que a poupem (descansos, férias, lazer), bem como às que a aumentem (alimentação, bebidas, etc). Em última análise, pode-se compreender tanto as necessidades motivacionais de Herzberg quanto a saída do estado de repouso de McGregor como uma tentativa de satisfazer a necessidade de satisfação. Cerco-me de serviçais que tragam minha comida e arrumem minha cama, e de soldados que lutem por mim. Dessa forma, não tenho necessidade de cuidar das minhas necessidades, e retorno ao estado de repouso.

Para satisfazer-me, seja higiênica ou motivacionalmente, traço estratégias.

 

Estratégias

O objetivo final de qualquer estratégia é um estado diferente do inicial, sendo um tal estado visto como capaz de causar as alterações compreendidas como necessárias. O atingimento de um estado final pode exigir etapas intermediárias, cada qual exigindo estratégias próprias, formando caminhos ao final.

Como chegar de um estado ao outro (intermediário ou final), pode ser determinado pelas possibilidades de mudanças apresentados pelos elementos constituintes do estado atual (conhecimento). Cada mudança se encaixando em um mecanismo de alteração. Tal processo é governado pela lógica.

Já a visualização de estados adicionais, que sirvam de possíveis passos para a satisfação de uma necessidade é um processo da imaginação. Uma vez que a lógica baseia-se no conhecimento de elementos, e tomando-se por base que é impossível saber tudo sobre tudo, a criatividade torná-se uma parte importante no processo de definição estratégica. Mesmo na definição do objetivo final, estado a respeito do qual não se sabe “tudo”, a imaginação de parte de seus atributos (os não-conhecidos), é obrigatória.

Uma estratégia ou um conjunto delas formam um mesmo plano, desde que visem um mesmo objetivo.

Uma vez traçado, um plano deve ser validado pela implementação, avaliando-se a validade dos conceitos funcionais atribuídos a cada modalidade de acionamento dos elementos envolvidos (se suas reações são corretas para o plano em questão). A concretização do objetivo inicial valida o plano, assim como a não concretização fornece informações adicionais sobre os elementos envolvidos, permitindo assim uma correção do plano inicial.

Objetivos que demandem concretizações contínuas (satisfação de fome, sede, busca de segurança, etc), criam planos que devem ser implementados constantemente, formando assim modelos de comportamento. Um modelo tem um objetivo (o mesmo dos planos em si), além de avaliações de realização potencial, importância, etc.

 

Modelos comportamentais

A toda ação corresponde uma reação. Tão verdade na física quanto nos seres vivos.

Nos anos 70 do Século XX, uma associação entre um estudioso de matemática, computação e depois psicologia, chamado Richard Bandler, e um professor adjunto de lingüística, John Grinder, revolucionou o tratamento psicológico através de uma técnica chamada de Programação Neuro-Lingüística, ou PNL. A base desta técnica é um conceito chamado de Modelo do Mundo, ou Mapa da Realidade, que é definido como:

"A representação do mundo singular de cada pessoa construída a partir de suas percepções e experiências individuais. Não é apenas um conceito, mas toda uma maneira de viver, respirar e agir."

Glossário de Termos de PNL, disponível em http://www.golfinho.com.br/artigos/glossari.htm

As entidades, eventos, cenários, períodos, etc, não recebem só significados. Recebem também associações à toda uma estratégia comportamental que (entende-se), deva ser utilizada como resposta à essas percepções.

Da mesma forma que o processamento da dor evoluiu para estruturas mais complexas nas camadas superiores, o arco-reflexo das bactérias (e nosso), que nos diz claramente o que fazer com uma dada sensação, simples, física e automaticamente, evoluiu para seqüências de padrões de comportamento os quais acreditamos (conhecimento), sejam a melhor maneira de responder às novas formas sensoriais. Dessa forma, a cada identidade ou cenário presenciados, evocamos uma estratégia de comportamento associada.

As estratégias podem já estar prontas ao nascermos (arquetípicas - tartarugas vêem o mar e correm para ele), aprendidas por imitação (ando e falo dessa forma porque ela faz assim e funciona), ensinadas formalmente ou simplesmente deduzidas.

A unidade fundamental do sistema de atuação senciente é o MODELO, entidade composta por uma ou mais combinações sensoriais, já significadas (dotadas de atributos), às quais associamos estratégias comportamentais como formas de reação.

 

Ativados pelos sentidos, os modelos associam às sensações todo um conjunto de informações, como objetivos, posturas à assumir, prioridades ou urgências (dada a situação percebida), e seqüências de ações à serem adotadas.

Portanto, as ações que adotamos a cada momento NÃO SÃO conseqüências diretas da realidade em si, mas associações feitas a uma determinada combinação sensorial. A grande maioria dessas associações (ou "crenças"), é feita de forma inconsciente. Através de arquétipos ou observações e avaliações do mundo feitas ainda em idade precoce, criamos nossos Modelos do Mundo, os quais dirigem o resto de nossas vidas, salvo quando da ocorrência de situações desastrosas, que nos forçam a "REAVALIAR" nossas "FORMAS DE PENSAR".

Os modelos são criados (e reforçados), através de processos sensoriais não-linguísticos, o que denota o primitivismo de seus mecanismos, bem como a extensão de sua abrangência à formas de vida distintas da humana.

Uma das técnicas mais antigas da PNL é chamada de "ancoragem", e é implementada através da associação de um conjunto de emoções positivas (com suas ações derivadas desse estado), à idéias (conceitos, cenários), que anteriormente foram associados a um conjunto de emoções negativas. Por exemplo, alguém com medo de aviões devem primeiro pensar em coisas que o façam sentir-se muito bem, feliz e relaxado. Uma vez que o "estado positivo" esta "instalado" (preencheu a mente), deve-se pensar em "entrar num avião". A repetição desse exercício acaba fazendo com que o "entrar num avião" fique associado (ancorado), ao novo conjunto de emoções positivas.

Nesse caso, a associação é feita de forma consciente, porem seguindo exatamente o mesmo mecanismo que um dia, por alguma razão não-percebida, fez com que todo um conjunto de emoções negativas ficasse associada ao mesmo ato. Quando um modelo é ativado, instala-se um "ESTADO", que dita desde nossa interpretação dos fatos, todo os comportamentos e palavras (no caso de humanos) e planos que fazemos. Quando um ambiente ácido é percebido pelas terminações sensoriais de uma bactéria, instala-se um estado de alerta, e adota-se a estratégia de abanar seus pseudopodes até que a percepção do ambiente agressivo cesse. Quando o conjunto de percepções sensoriais de uma mulher é percebido como "ele não vai me levar para sair hoje", instala-se um estado de descontentamento. Comandos elétricos são dirigidos aos músculos da testa e da boca ("franzir a testa e fazer beicinho"), bem como aos que controlam seus membros superiores ("cruzar os braços") e do pescoço ("empinar a cabeça"), até que seus sensores captem o termino da ameaça ("o marido se dirigindo ao quarto para trocar de roupa"). Evolução de um mesmo mecanismo.

Estratégias comportamentais são compostas por entidades menores chamadas de "ações". No caso da senhora descontente acima, a estratégia assumida foi 1) franzir o sobrecenho 2) fazer "biquinho e 3) cruzar os braços. É certo que ainda havia ações adicionais à se executar nessa estratégia (ou "plano"), caso as primeiras não surtissem o efeito desejado (como começar a respirar mais forte ou "bufar" para chamar a atenção, cantarolar ou telefonar para a mãe dizendo o quanto as coisas andam difíceis por lá). Os planos de cada modelo são implementados na medida em que a prioridade ou urgência atribuída ao modelo o exige, assim como as ações são executadas na medida da necessidade de resultados, indo das mais simples às mais complexas ou exigentes.

Os modelos são criados durante nossa fase de crescimento porque PRECISAM estar prontos quando de nossa fase de maior responsabilidade. Ao atingir sua idade adulta, uma entidade biológica já deve saber como reagir ao mundo que a cerca. Só dispôs de tempo para "entender" ou "avaliar" a realidade durante sua maturação, especialmente enquanto outros se incumbiam da realidade por ela, e concedendo à forma em crescimento imunidade suficiente para que errasse e aprendesse. Mais tarde, as exigências da vida adulta não são tão generosas, e errar (ou demorar para reagir), pode custar sua existência e a de outros como ela.

O preconceito, a ostentação, a busca do poder, a prepotência, o ditatorialismo, a arrogância, o querer-se ser mais ou melhor que outros, são algumas das formas de expressão agressiva do medo de estar errado (meus modelos estão incorretos). Biologicamente falando, modelagem incorreta da realidade significa morte.

É por isso que essas formas de comportamento causam prazer físico. Elas satisfazem instintos antigos. Tem reações biológicas. Por outro lado, ser comedido e educado, respeitar pessoas e opiniões alheias, apesar de correto, não nos causa prazer em nível equivalente. Apenas a satisfação da consciência de uma ação correta. Decisões assim são tomadas por níveis que não interagem tão intimamente com nossas glândulas e (conseqüentemente), instintos primários.

O que impulsiona algumas das piores atitudes humanas é o prazer pela auto-preservação. A batalha entre o "bem" e o "mal" encontra-se enraizada em nós, na forma da escolha entre o prazer orgânico e a decisão inteligente. É a luta entre o que fomos (e somos), e o que estamos aprendendo a ser.

Um ponto interessante sobre as decisões quanto aos modelos à serem ativados é que os mesmos passam por um processo de votação, no qual mesmo as camadas mais subconscientes tem voz ativa. Estudos recentes (John A. Bargh e Lawrence Williams de Yale, Chris Frith do University College London), demonstram grande atividade e poder de influência do pallidum ventral, área localizada na parte do cérebro conhecido como complexo reptiliano, e que opta por modelos adequados à sugestões subconscientes, como a presença de objetos, cheiros ou temperaturas do ambiente, influenciando sensivelmente experimentos comportamentais.

 

Relacionamentos

A epistemologia (ou estudo da formação do conhecimento), nos ensina que um dos processos mais importantes na formação do conhecimento são as relações entre o "EU" e o "NÃO-EU" (ou seja, todo o resto do universo). Nesse processo, um dos momentos mais fundamentais é aquele no qual, ainda nas mais tenras idades, surge a noção dessa separação. Não somos tudo. Partes essenciais (para mim), do universo, estão SEPARADAS de mim. Não são "EU". Não estão sob meu direto controle. Não sou auto-suficiente.

Nesse momento, nossa bactéria primordial agita-se ante a ameaça detectada, ante a consciência da necessidade de outras entidades para a própria preservação. Surge a necessidade do relacionamento.

Nossos relacionamentos são baseados nas nossas necessidades. De certa forma, relacionamo-nos com nós mesmos. Buscamos a complementação. Buscamos em outras entidades (pessoas, animais domésticos, plantas, carros, livros, etc), o que sentimos faltar em nós mesmos. A principal origem de frustração em relacionamentos de qualquer espécie é a não correspondência do outro às necessidades que deram inicio a relação em si. Buscamos preencher as lacunas das quais começamos a nos dar conta no início de nosso desenvolvimento, e outras que percebemos ao longo da vida.

A correspondência percebida de uma dada entidade com uma necessidade (também percebida), determina uma das medidas de importância dessa entidade. A outra é dada pela posição que esta necessidade ocupa em nossa hierarquia de urgências. Quanto maior a importância, maiores os nossos esforços para mantermos a conexão entre o "EU" e um determinado "NÃO-EU" que satisfaça uma determinada lacuna.

Necessidades de correções genéticas, preferências por características físicas e composição de raça ditam boa parte de nossas escolhas sexuais. Diferentemente, necessidades de progresso pessoal, diversão e segurança controlam nossas escolhas de amizade. Significados atribuídos a objetos ou idéias, lembranças associadas a vasos de plantas ou quadros desempenham papeis semelhantes.

Um psicólogo brasileiro uma vez definiu o amor humano como sendo "... o prazer pelo que se é quando se esta com o outro", seja esse outro o que for (a cada um o que é seu). Não nos relacionamos com "NÃO-EUs" pelo que são, mas pelo que representam para nós. Amamos (gostamos, prezamos, sentimos falta, nos apegamos.., etc) os "pedaços-de-mim".

Uma outra forma de relacionamento é a de aversões, antagonismos, oposições e ódios.

Todos nós temos partes não resolvidas em nosso desenvolvimento, na forma de temores e desejos não realizados. Coisas de que não gostamos a nosso respeito. Coisas que nos envergonham ou amedrontam. Coisas que nos deixam com raiva ou angustiados. Reagimos contra elas. As escondemos de todos e tentamos escondê-las até de nós mesmos. Entretanto, de tempos em tempos, esses aspectos personificam-se na forma de "NÃO-EUs", tão difíceis de se controlar quanto os primeiros, quanto os desejados.

Acho que sou covarde e que deveria ser mais corajoso. Tenho vergonha disso em mim. Por isso, a visão de uma pessoa de atitudes ousadas me humilha perante a mim mesmo. A existência dela me humilha. A humilhação é a percepção de que minha estratégia de vida não esta correta. Não me trás os resultados que acho que deveria. Sinto-me inferiorizado (percebo-me como menos apto), e isso afeta diretamente os meus mecanismos de auto-preservação. Preciso reagir. Passo a ODIAR esse "NÃO-EU", e o agrido como posso. Se ele deixar de existir, minha situação de inferioridade, conforme a percebo, deixa de existir (o "NÃO-EU" era menos apto pois não conseguiu sobreviver). Nesse caso, minha relação de ódio também será maior quanto maior for a importância da falha percebida.

Mesmo no ódio, nos relacionamos conosco mesmos (segue em Bases Filosóficas e Psicológicas 2)

 

Inteligência

Inteligência é o nome dado à um coletivo de processos mentais, cuja finalidade principal é lidar com a realidade, e que inclui processos distintos como:

bulleta compreensão: apreensão correta da realidade percebida, sendo assim a capacidade de relacionar corretamente uma percepção à uma estrutura de conhecimento. Ao ver uma arvore, suas características são relacionadas com de outras, percebidas anteriormente. Ainda sob este processo encontra-se a capacidade de construir um modelo representacional novo, caso a realidade percebida não apresente relações com as anteriores.
bulleto raciocínio lógico: a partir da compreensão correta (do evento, objeto ou outra fonte sensorial presente), desenvolver uma cadeia causal válida para o mesmo. Neste ponto, o nível de inteligência pode ser dado pela complexidade ou "tamanho" da rede desenvolvida.
bulletcapacidade inferencial ou dedutiva: "isto" que está presente SIGNIFICA QUE "x". Conseqüência natural do raciocínio lógico, somado à memória de significados em situações equivalentes.
bulletescolhas: dadas as informações obtidas, o melhor curso de ação seria "z", novamente surgindo como conseqüência das informações anteriores. Neste ponto, assim como ocorre com a compreensão, caso não haja um modelo comportamental já avaliado previamente como apropriado, faz-se necessária a construção de um novo.
bulletadaptabilidade: o ato de constantemente verificar os resultados obtidos a partir dos cursos de ações selecionados, comparando-os aos desejados

Portanto, mesmo sendo composta por atividades distintas, executadas em momentos diferentes, a inteligência acaba sendo avaliada como a média de acertos obtidos no mundo real, pela implementação dos modelos selecionados para cada circunstância. A avaliação da inteligência só é possível através de ações (mesmo que a ação selecionada seja o não fazer nada para aquele caso). Caso as compreensões de entidade e relações causais, bem como os modelos e suas conseqüências, não sejam aferidas na realidade, as mesmas tornam-se simples exercícios de imaginação (imagens de ações, ao invés de ações em si).

 

Consciência

Consciência é um grupo de meta-sentidos (sentidos dos sentidos), que utilizam a percepções de um curso de atividades (mentais, físicas, ambientais), obtidas pelos mecanismos sensoriais. Suas funções principais são o acompanhamento do que se passa internamente (auto-consciência(AC)), externamente (consciência externa de entidades(CE), eventos(CV) ou situações(CS)), e execução de escolhas apropriadas, baseando-se nas projeções das conseqüências de cada ação selecionada (consciência de atos(CA)).

Distingue-se do restante dos sentidos, primeiramente por apoiar-se em informações obtidas por eles, ao invés de acessar diretamente a realidade e pela capacidade de filtrar as informações para análise (foco ou atenção). Uma outra grande distinção reside na habilidade de operar tanto sobre o fluxo atual quanto de um relembrado.

A atividade da consciência externa de entidades (CE), pode valer-se de funções neurais especializadas (neurônios-espelho, variações de freqüência e associações metaestáveis), capazes de replicar no próprio organismo as dinâmicas observadas em outros indivíduos, para dai concluir a respeito de suas motivações ou propósitos. Quando voltada para a própria entidade (foco interno - auto-consciência(AC)), permite a compreensão parcial do que está a ocorrer num dado momento. Seus humores, sentimentos e estados emocionais, por exemplo, servindo de motivação à um processo racional sendo seguido ("sinto-me fraco (físico, baixo nível de glicose, cansaço); percebo o ambiente à volta como ameaçador (sentimento, interpretação das informações ambientais); a sensação de ameaça é forte o bastante para me fazer decidir por deixar o local (emoção); estou no elevador, dirigindo-me à saída"). O processo foi definido anteriormente. A consciência o monitora, certificando-se de sua coerência com o padrão previamente definido.  

O acompanhamento dos eventos(CV) ou situações(CS) externas é feito verificando-se sua coerência, entre as informações em si e entre as mesmas e um modelo de universo pré-armazenado. Estar consciente, neste sentido, é avaliar, de momento a momento, o estado geral e as ocorrências (ou a ausência delas), no mundo externo ou interno, detectando discrepâncias e reagindo a elas.

Uma analogia simples seria a de milhares de jornalistas pelo mundo, cada um gerando uma reportagem sobre o que ocorre em seu local naquele momento, e sendo todas transmitidas por meios diferentes (mídia impressa, Internet, rádio, tv, etc). A consciência seleciona um assunto de seu interesse, e "varre" o fluxo de entrada, buscando o que deseja naquele momento e ignorando o restante. As informações assim obtidas são comparadas com um modelo, afim de verificar se "algo mudou no mundo".

Já a consciência de atos(CA) opera selecionando, a cada momento, a resposta considerada apropriada para uma dada situação, levando em conta a projeção das conseqüências de tal escolha. A ação selecionada implica na intencionalidade da mesma, significando um meio para um fim e, portanto, declarando a intenção original. Quando o resultado obtido não foi o desejado, temos um erro (ato e conseqüência não-intencionais). Tais analises encontram-se na base do Direito.

A maior parte do que acontece nunca chega ao nível do processamento consciente.

Os outros sentidos detectam o ambiente, atribuem significados, geram estados e dai definem ações. Os processos cognitivos geram conhecimento a partir das informações acumuladas, criando assim um modelo representativo do universo. Os processos da consciência operam a partir da observação das ações para, dai, seguirem às avessas, comparando com o modelo baseado nas emoções, estados e significados sensoriais que o causaram. E nisso reside sua fragilidade. A exceção de significados e emoções arquetípicas, as entidades raramente fazem as mesmas coisas pelas mesmas razões. Distinções culturais e históricas, por exemplo, podem alterar tais relacionamentos até limites de inversão. Uma saudação esfuziante entre famílias do oriente médio pode ser interpretada como o início de uma briga por alguém de origem ou criação nórdica (especialmente se a linguagem não for compreendida, e toda a avaliação tiver de ser feita baseada em suas próprias associações). Em um grupo de origens e tradições semelhantes, este tipo de mal-entendido fica por conta de outras distinções (familiares, histórico pessoal, etc).

Baseiam-se no "por que" e, conseqüentemente, na lógica, uma vez que tem por função básica a interpretação da coerência do que é sentido e a propriedade das respostas selecionadas. O restante dos processos mentais opera sem razões explicáveis. Uma vez associada uma atribuição à uma entrada sensorial, devido à uma situação vivida no momento ou aprendida de outra forma, tal associação se mantém e produz resultados no organismo. Já uma operação consciente exige que ligações causais sejam definidas (mesmo que tais interpretações de causa-e-efeito estejam incorretas).

Na fronteira entre consciente e inconsciente está a dependência intrínseca da primeira das associações efetuadas pela última.